NBR 6123:2023 Principais alterações na revisão da norma brasileira para determinação das forças devido ao vento em edificações 

Dentre as ações atuantes em uma estrutura, a ação do vento é uma das cargas que provoca grande impacto no dimensionamento, principalmente para estruturas muito leves, edifícios altos de múltiplos andares, pontes e torres de transmissão.   

No Brasil, os critérios necessários para o cálculo dessa carga estão apresentados na ABNT NBR 6123: Forças devidas ao vento em edificações. Em 2023 esta norma, que estava sem revisão desde 1988, foi atualizada trazendo consigo uma série de mudanças significativas.  É crucial que os profissionais da área estejam cientes das novas diretrizes e compreendam como elas podem influenciar seus trabalhos. Por este fato, a seguir serão discutidas as principais alterações promovidas pela revisão. 

A velocidade básica do vento (Vo) é um fator meteorológico que possui efeito quadrático sobre o resultado da pressão dinâmica e, consequentemente, é sua determinação foi um dos tópicos mais discutidos durante a reformulação do documento.  Este assunto foi abordado diversas vezes nas Comissões de Estudo Especiais (ABNT/CEE), entretanto não foi obtido consenso em relação a alterações para o mapa de isopletas (linhas de contorno que representam valores constantes da velocidade do vento). Dessa forma, o mesmo mapa da versão de 1988 foi utilizado e o tema será retomado e incorporado futuramente por meio de Emenda na nova norma.  

1. Alteração em Imagens

Percebe-se na publicação alteração na qualidade de todas as imagens, gráficos e tabelas apresentados, além de adição de mais informações. Um exemplo desse aprimoramento pode ser observado na representação do fator topográfico S1 como mostrado na Figura 1. Apresenta-se uma comparação entre a qualidade da imagem antes e depois do processo de recriação, sendo possível constatar maior nitidez e inclusão da região de incremento de velocidade no ponto B na nova imagem.  

Essa mudança facilita o entendimento dos conceitos apresentados e contribui significativamente na redução nos erros de interpretação. A nova imagem permite ao leitor distinguir de forma mais clara o incremento do parâmetro S1 no perfil de velocidades por meio da redução da seção de escoamento do ar em áreas de desnivelamento ascendentes, enquanto o parâmetro S2 define o perfil de escoamento laminar baseado nas equações de camada limite. 

Figura 1 – Fator topográfico S1 – Mudança na qualidade das imagens 

2. Alterações na organização

Todo o texto da norma foi revisto e passou por substancial reorganização, resultando em uma nova disposição das informações. A reorganização das ideias resultou em um conteúdo mais claro para os usuários e, por conseguinte, promoverá uma comunicação mais eficaz.  

Como uma das estratégias empregadas para atingir esse objetivo, houve incorporação dos anexos ao longo do texto. Os anexos D a G foram incluídos em tópicos pré-existentes e os anexos H e I deram origem a itens inéditos. Os anexos A, B e C foram mantidos. A relação entre os anexos da norma antiga e os itens correspondentes na nova versão são as seguintes:  

  • ANEXO D – Determinação do coeficiente de pressão interna (item 6.3.3) 
  • ANEXO E – Coeficientes aerodinâmicos para coberturas curvas (item 6.2.3) 
  • ANEXO F – Informações adicionais (item 6.1.1) 
  • ANEXO G – Efeitos de vizinhança (item 6.4) 
  • ANEXO H – Efeitos dinâmicos em edificações esbeltas e flexíveis (item 10) 
  • ANEXO I – Determinação da resposta dinâmica devida à turbulência atmosférica (item 9) 

Na versão anterior, a equação para calcular a força do vento era repetida em várias partes do texto, o que resultava em uma compreensão menos clara e organizada do conteúdo. Entretanto, na atualização, uma melhoria substancial foi implementada: a equação é agora apresentada de forma proeminente logo no início do documento, permitindo que o leitor identifique imediatamente a base matemática necessária para o cálculo da força do vento. Adicionalmente, o fator de vizinhança (fv) foi incorporado nessa equação juntamente com Figura 2 que ilustra os parâmetros utilizados no seu cálculo. Anteriormente, este fator era mencionado no anexo G e não era evidente a necessidade de sua consideração e, por muitas vezes, fenômenos como efeito venturi ou efeito de galope eram desconsiderados em cálculo de edificações urbanas por desconhecimento ou incompreensão dos projetistas. 

Figura 2 – Efeito de vizinhança 

3. Alterações de conteúdo

3.1 Fator S3 – Fator baseado em conceitos probabilísticos 

A Figura 3 apresenta uma comparação dos valores do fator probabilístico S3 entre a versão anterior e a atual da norma, sendo as regiões marcadas em azul as alterações, em vermelho as remoções e em verde as adições.  

Para o grupo 1 houve modificação do fator S3 de 1,10 para 1,11, e inclusão de novos tipos de edificações, tais como pontes rodoviárias, ferroviárias e estruturas destinadas a substâncias inflamáveis, tóxicas e/ou explosivas.  

Verificou-se a adição do grupo 2 voltado para edificações com aglomerações de pessoas. Por este motivo, os grupos anteriores 2 e 3 foram renumerados para, respectivamente, 3 e 4, sem alterações em seus escopos ou valores. Não foram observadas mudanças para o grupo 5.  

O antigo grupo 4 ao qual pertenciam os elementos de vedações foi removido e estes elementos passaram a integrar o grupo da edificação a qual pertencem. Exclusivamente para o cálculo de elementos de vedação, é permitido reduzir o fator S3 com um fator igual a 0,92. Como mostrado na coluna cinza a direita da Figura 3, os valores o fator a ser utilizado para o cálculo das vedações será igual ao proposto na versão de 1988 para o grupo 4. Para o grupo 5 o fator S3 será menor e conduzirá a dimensionamentos mais rigorosos para as edificações dos grupos 1, 2 e 3.  

Figura 3 – Alterações no fator S3 

Para avaliar o impacto desta alteração, foi conduzido o dimensionamento das terças de fechamento e de cobertura de um galpão em estrutura de aço (Figura 5) de tamanho 10 por 20m, pé direito de 6m e inclinação da cobertura de 10%. Ocorre aumento de 4,4% no fator estatístico e na velocidade característica. Na pressão que varia de forma quadrática com o fator S3, ocorre um aumento de 9% na carga a ser aplicada.  

Para avaliar o impacto dessa modificação, foi realizado o dimensionamento das terças de fechamento e cobertura de um galpão construído em estrutura de aço, conforme ilustrado na Figura 4. Observou-se um aumento de 4,4% tanto no fator estatístico quanto na velocidade característica. Além disso, em relação à pressão, que varia de forma quadrática com o fator S3, registrou-se um acréscimo de 9% na carga a ser aplicada.  

Em consequência das alterações supracitadas nos carregamentos, o dimensionamento da estrutura frente aos estados limites últimos (ELU) e de serviço (ELS), foi impactado. A Figura 5 exibe o dimensionamento para ELU conforme as recomendações das duas versões da norma. Nota-se que o índice de utilização das barras aumentou tendo algumas peças mudado de faixa de utilização da cor verde (I.U. entre 0,5 e 0,7) para amarela (I.U. entre 0,7 e 0,9) e apresentando aumento de até 5,6%. Apesar de nenhuma das barras ter sido reprovada nesse estudo, casos em que o dimensionamento for realizado com menor margem de segurança este fato pode acontecer principalmente para edificações do Grupo 1 em que a velocidade característica nos elementos de vedação sofre um aumento de 16% em relação a norma antiga e, consequentemente, a pressão dinâmica calculada é elevada em 34%.  

(a) NBR 6123: 1988
(a) NBR 6123: 2023
Figura 4 – Verificação do Estado Limite Último dos elementos de vedação 

Para o ELS, a Figura 5 expõe os valores dos deslocamentos para os três nós cujo aumento foi mais significativo. Na direção X e Y, os valores alcançam valores até 14,83% maiores. Enquanto na direção Z, o impacto é menor, chegando a valores aumentos de até 2,62%. Com esta análise conclui-se que a alteração do valor do fator S3 pode impactar de maneira relevante os resultados e o dimensionamento dos elementos de vedação. 

Figura 5 – Verificação do Estado Limite de Serviço dos elementos de vedação 

3.2 Avaliação de conforto humano 

A avaliação do conforto humano é feita por meio do cálculo da amplitude de acelerações decorrentes de oscilações da estrutura. Na versão anterior da norma, a fórmula para calcular a amplitude de aceleração máxima estava presente e o limite de aceleração vertical permitido era de 0,1 m/s². Na nova versão foi introduzido um novo item destinado a limitar essa amplitude limite de aceleração máxima, visando fornecer uma orientação mais precisa direcionada para o tipo de edificação (residencial ou comercial) baseado na curva de conforto ISO-2631 para o limiar de percepção que também varia em função da frequência natural de vibração da edificação, como mostrado no gráfico da figura abaixo.  

Figura 6 – Curva de limiar conforto humano para exposição a vibração. Fonte: NBR 6123:2023 

É possível observar que, exceto para edificações com frequência fundamental abaixo de 0,3 Hz e acima de 3 Hz, o valor limite do pico de aceleração será inferior ao exigido pela norma mais antiga, ou seja, a maior parte das edificações terá uma exigência normativa menos rigorosa para o cumprimento deste critério de conforto humano.  

3.3 Vibração por desprendimento de vórtice 

Sistemas estruturais esbeltos e flexíveis, como cabos, torres, edifícios altos, chaminés e pontes são os mais vulneráveis aos impactos do desprendimento de vórtices por se encontrarem em uma região de regime laminar de escoamento. Este fenômeno pode gerar vibrações de grande amplitude quando a frequência de desprendimento de vórtices se acoplar com alguma frequência natural da estrutura.  

Para tratar desse assunto com maior nível de detalhe, foi introduzido o item 10 que incorporou o texto presente na versão de 1988 e incluiu algumas disposições presentes no Eurocode EN 1991-1-4 (Eurocode 1: Actions on structures – Part 1-4: General actions – Wind actions).  

Estes efeitos dinâmicos são possíveis se a velocidade crítica calculada do vento for igual ou inferior à máxima velocidade média prevista para o local da edificação.  Anteriormente, eram fornecidas diretrizes para cálculo da velocidade crítica em que esse fenômeno pudesse acontecer, mas não eram apresentados valores de referência para a velocidade média, o que não permitia que por vias normativas fosse verificada a possibilidade de ocorrência desse fenômeno. A versão revisada propõe uma formulação para realizar o cálculo da velocidade média adotando um parâmetro S2 corrigido para a condição de velocidade média em um intervalo de tempo de 600s em função da categoria do terreno. A velocidade crítica deve ser superior à velocidade média majorada por um coeficiente de segurança de 1,25 e, caso este critério não seja atendido, foi incluída na nova versão uma formulação permite: 

  • Estimar a resposta em termos de deslocamento máximo para estruturas autoportantes de seção circular, como chaminés e torres de observação; 
  • Avaliar a suscetibilidade de edifícios de seção retangular à vibração induzida pelo desprendimento de vórtices.  

3.4 Coeficientes de arrasto para tabuleiro de ponte 

Na última atualização da norma, foi introduzido o item 11 inédito e específico para o cálculo da ação do vento em pontes. As seções transversais típicas estão apresentadas na Figura 7. 

Figura 7 – Configurações geométricas de seções transversais típicas de pontes 

Para verificar a necessidade de análise do comportamento dinâmico e da estabilidade aerodinâmica de uma ponte sujeita a ação do vento, a norma propõe o cálculo do parâmetro de susceptibilidade à excitação aerodinâmica (Pae). Em função dos valores obtidos, a estrutura é classificada em 1, 2 e 3 e quando enquadrar-se na classe 1, os efeitos dinâmicos podem ser desconsiderados e é feita apenas a análise estática.  Os demais casos devem ser avaliados com maior cautela, sendo feita a análise dinâmica e em alguns casos a análise aeroelástica e ensaios por túnel de vento. 

No que diz respeito à análise estática, que se aplica às pontes da classe 1, são calculadas as componentes de força estática Fx e Fz (direções x e z) a partir dos valores do coeficiente de arrasto. Como mostra a Figura 8, os coeficientes dependem da largura do tabuleiro (B) e da altura equivalente do tabuleiro associada à área exposta ao vento (Heq). Apesar de não ilustrada, deve ser considerada uma força de atrito na direção y atuante quando o vento incide paralelamente ao eixo do tabuleiro.

Figura 8 – Componentes de força estática de vento sobre o tabuleiro e coeficientes de arrasto 

Para avaliar a sensibilidade da relação entre altura e largura do tabuleiro no coeficiente de arrasto, elaborou-se os gráficos apresentados na Figura 9 para Cx e na Figura 9 para Cz. Os gráficos ilustram a variação dos coeficientes em função do aumento da largura do tabuleiro de 0 a 25, mantendo-se a altura equivalente constante e igual a 2 m. 

Na versão anterior desta norma, por falta de orientação específica para tabuleiro de pontes e passarelas, o cálculo do coeficiente Cx era feito pela formulação de forças para muros e placas retangulares, levando a um coeficiente de força igual a 2,0 e, além disso, não havia orientações para o cálculo de Cz, o que levava muitas vezes à desconsideração desse efeito de levantamento provocado pelo vento. Considerando o proposto neste novo item, o coeficiente possui uma variação exponencial, como mostra a Figura 8. Assim sendo, na maior parte dos casos os valores são inferiores a 2,0 e os novos resultados se tornarão menos conservadores que os calculados pela norma antiga.  

Figura9 – Gráfico: coeficiente de arrasto Cx versus largura do tabuleiro (B) 

Em relação ao coeficiente Cz, de acordo com a formulação sugerida na norma, os valores formam uma envoltória, pois podem ser positivos ou negativos. Além disso, pode-se adotar Cz igual a ±1 para considerar variações à pequena superelevação do tabuleiro, à presença de taludes a barlavento e à inclinação instantânea do vetor velocidade de vento turbulento. Nestes casos, adotar Cz = +1 de forma conservadora é adequado, pois sua curva sempre fica abaixo de 1. No entanto, quando se adota o valor de -1, existe uma largura de tabuleiro a partir da qual o valor de Cz ultrapassa o limite. Isso significa que pontes mais largas devem ter uma análise desse parâmetro realizada de forma mais cautelosa. 

Figura 10 – Gráfico: coeficiente de arrasto Cz versus largura do tabuleiro (B) 

É possível notar que a nova formulação da norma NBR 6123 influencia de forma mais relevante na determinação de ações do vento em estruturas de tabuleiro que apresentam menor relação entre largura e altura de tais como passarelas. Além disso, os efeitos de levantamento e momento desestabilizante estabelecidos pela introdução do Cz na norma leva a menores reações de apoio em estruturas com menores ações permanentes, como as passarelas. Essa combinação de fatores poderá influenciar significativamente no dimensionamento desse tipo de estrutura, tendendo a exigências mais rigorosas quanto ao tombamento e regiões de apoio das passarelas.  

As mudanças implementadas na norma representam um avanço significativo nos cálculos relativos ao vento em estruturas. Ao introduzir novos itens e estabelecer diretrizes mais claras para os cálculos, proporciona uma abordagem mais concisa para os cálculos e alinhada aos estudo mais recentes e normativas internacionais como a EN-1991-1-4. Essas melhorias tendem a contribuir significativamente para a melhora do cálculo de estruturas sob ação do vento. 

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